Entrevista Cecabank e GPT Advisors
Em junho deste ano, Cecabank confirmou a sua participação no espaço controlado de provas (sandbox) impulsionado pela Comissão Nacional do Mercado de Valores (CMVM) para a transformação digital do sistema financeiro junto a GPT Advisor no que é o único projeto de inovação financeira baseada em Inteligência Artificial selecionada pelo organismo supervisor até a data. Falamos com Salvador Mas de GPT Advisors e Aurora Cuadros, de Cecabank sobre as implicações que terá este passo na indústria financeira.
Cecabank se une a outros projetos como Inversis, Santander, BBVA…para personalizar o assessoramento financeiro com IA. por onde vai a indústria com o uso da IA?
GPT: Desde 2023, que é quando começa a ser visível a irrupção da IA Generativa, todas as indústrias vão assimilando como se podem aproveitar dela. O setor financeiro, muito intensivo em informação e conteúdos, vai a ser um dos mais beneficiados por ela, e eu acho que agora estamos vivendo um processo dobro: por um lado, a ter uma visão de até que ponto esta tecnologia vai a transformar ou revolucionar o serviço financeiro a longo prazo; e ao mesmo tempo, a pôr-se mãos à obra e começar a fazer projetos para aplicar esta tecnologia a distintos casos de uso.
Cecabank: Os objetivos finais são dois. Por um lado, queremos aproveitar a IAG para incrementar as capacidades e prestações que oferecemos aos nossos clientes através dos nossos serviços e produtos. Por outro lado, buscamos identificar e abordar percursos de melhoria em termos de eficiência de processos, incorporando ferramentas baseadas em Inteligência Artificial que sejam adequadas para cada propósito.
Adicionalmente ao anterior, a nossa exploração persegue outros objetivos intermédios, como por exemplo o obter um profundo conhecimento e assimilar as caraterísticas e natureza desta tecnologia, estudando as melhores práticas para realizar uma integração inteligente e prudente da IAG dentro da nossa organização, sistemas e processos. Já sabemos que esta tecnologia tem uma utilidade e potencial enorme, mas agora o desafio reside em ser capaz de aplicar-la adequadamente no nosso negócio.
GPT: Em uma primeira fase, a IAG vai a ser muito boa simplesmente centralizando toda a informação e conteúdos de uma entidade financeira, o seu catálogo de produtos e serviços, por exemplo. E fazer-lo complementando com conteúdo formativo para os empregados da entidade. Muito antes que um cliente fale diretamente com um robô da sua entidade, vão a suceder que serão os empregados dessas entidades os que vão a ter estas ferramentas para ter uma melhor informação e formação dos serviços dessa entidade e a personalizar-los melhor à medida de cada cliente.
Em uma seguinte fase, já virá que o cliente fale diretamente com robôs (ou agentes) de cada entidade, e inclusive que este robô possa não só informar senão assessorar conforme às regras e ao compliance de cada entidade.
Cecabank: Pela sua natureza, a IA Generativa contribui especial valor em todos aqueles processos que trabalham com inputs e/ou outputs baseados em dados não estruturados; que normalmente não podem ser abordado por programas informáticos deterministas e que se resolvem com habilidades intrinsecamente humanas, como podem ser a linguagem ou a capacidade de arrazoado. Inicialmente, estes dados desestruturados acostumavam considerar-se em formato texto. Não obstante, as possibilidades crescem exponencialmente se consideramos as tendências para modelos de Inteligência Artificial multimodal, capazes de trabalhar simultaneamente com texto, imagens, áudio, vídeo…
Do anterior se desprende que as aplicações em processos, de uma forma eficaz, são infinitas: análise e resposta a consultas de clientes mantendo o trato personalizado que merecem, análise de informação de produtos provenientes de documentos não padronizados, suporte na execução dos projetos integrando a IA como um membro mais da equipa …
Do lado da gestão de carteiras, Acham que pode ensinar à máquina a gerir a incerteza do mercado e da sociedade global?
GPT: A principal revolução da IAG não vem, pelo menos por enquanto, relacionada com nada relacionado a prognóstico de mercados nem a otimização de carteiras nem coisas assim, isso virá da mão de outro tipo de IAs. O que acontece é que a borbulha da IAG é tão grande agora que muitos espevitados estão vendendo que isso também o vai a fazer bem. O que a IAG traz é uma revolução da linguagem e a comunicação. E o que pode trazer isso (como já vemos no mundo do cripto), é a um agente que tem a capacidade de aprender e convencer-nos de que sim tem essa capacidade…e portanto ganhar dinheiro dos incautos que lhe tenham achado.
Em que ponto fica o regulamento?
Cecabank: O regulamento ocupa um lugar extremadamente relevante à hora de integrar e utilizar IA na prestação de serviços de investimento. Dentro do espectro normativo devemos considerar duas categorias diferentes: por um lado, a normativa que vem a regular de forma específica e expressa o uso da IA e, por outro lado, o resto de normas que pudessem verse impressionadas indiretamente. . E de facto, no Sandbox da CMVM estamos vendo casos superinteressantes.
No lado do regulamento específico, na Europa se aprovou por parte do Parlamento Europeu, em março deste ano, a Lei de Inteligência Artificial (AY Act). Esta lei procura criar um marco legal harmonizado para garantir a proteção dos direitos fundamentais e públicos. Define e categoriza os sistemas e modelos de IA mediante um enfoque baseado no risco, entendendo-se o risco desde o ponto de vista de atentar contra os direitos dos cidadãos. Proíbe os sistemas de risco inaceitável e marca, segundo o seu nível de risco, os requisitos a cumprir pelo resto os sistemas de IA. Se bem que se trata de uma lei que procura fomentar a inovação, também estabelece requisitos sobre a transparência e governança de dados ou sobre necessidades de supervisão e cumprimento.
A respeito do resto de normativas que não sejam específicas sobre IA, cabe apontar que é necessário analisar como se modificam a organização, sistemas e processos de uma entidade à hora de integrar funcionalidades de IA. O objetivo é identificar quais destas mudanças acarretam a necessidade de uma adequação normativa para garantir o cumprimento normativo, p.e. em matéria de proteção de dados pessoais, sem ir mais longe.
Como beneficia isto ao usuário final e que tipo de usuário será o mais beneficiado?
Cecabank: Os benefícios da IAG para os usuários dependerão muito do tipo de uso e aplicação que se trate. Não obstante, com caráter geral, a IAG permitirá:
• Incrementar notavelmente o nível de personalização dos serviços, em todos os segmentos de clientes finais
• Oferecer mais e melhor informação a partir dos mesmos dados que dispõe a entidade, adequando as respostas a cada uma das consultas e requerimentos de informação do usuário (p.e. através de ferramentas coloquiais de tipo chat, configuradas com dados e objetivos muito específicos)
• Ganhar tempo e reduzir esforços na análise de informação
• Facilitar a toma de decisões
• Melhorar os níveis de satisfação de empregados e clientes, eliminando dos processos certos tarefas desincentivadoras
Em termos potenciais, todos os usuários (gerentes e outros empregados, clientes, fornecedores…) se poderiam beneficiar na mesma medida das melhorias previstas com a aplicação da IAG, sempre e quando se busque resolver problemas concretos de cada tipo de usuário.
Ativos digitais, tokenización… Por onde irão os próximos passos do setor?
Cecabank e GPT: Na nossa opinião, os ativos digitais são já uma realidade e chegaram para ficar. A tokenización de ativos é um recurso que pode dotar aos mercados de capitais de uma versatilidade sem precedentes. No campo dos ativos digitais e a tokenización vemos uma atividade frenética em distintas direções, com uma comprida projeção em cada uma delas:
• Criação de novos mercados organizados baseados em DLT, sob a normativa do regime piloto
• Novos serviços de custódia de ativos
• Introdução de novas figuras na cadeia de valor (p.e. ERIR)
• Novos produtos de investimento (fundos de investimento que investem em criptomonedas ao contado)
• Introdução de CBDCs (Central Bank Digital Coins – dinheiro digital de banco central)
• Serviços de tokenización de instrumentos financeiros (de renda fixa ou renda variável) para emissores sem acesso ao mercado de capitais tradicionais (empresas pequenas e medianas)
• Introdução de oferta de ativos digitais no catálogo de serviços de entidades de crédito consolidado e geralista…
O que estamos vendo é que o mercado, através dos seus distintos players, avança no paralelo em todas as linhas mencionadas, buscando criar e/ou consolidar novos ecossistemas que contribuam um valor diferencial sobre as estruturas de mercado atual, ao mesmo tempo que se busca fortalecer estes novos sistemas para dotar-los da confiança necessária para atrair a um amplo público.